terça-feira, 11 de março de 2014

TQ 01 3 Converter ... em efeito

Homem orante com a filha - estela funerária pagã - Kom Abu Bihu séc. III-IV, Egito.
Depois de termos sido como que iniciados, de modo adequado, nas «atividades» quaresmais do jejum e da esmola, eis que hoje o Senhor se faz, para nós, um mestre de oração. Antes de colocar no nosso coração e sobre nossos lábios algumas expressões capazes de traduzir a necessidade da nossa vida e o desejo de nosso coração, o Senhor Jesus nos indica, indiretamente, como a atmosfera mais apta à oração é a moderação e uma espécie de quietude de fundo: «Quando orardes, não useis muitas palavras, como fazem os pagãos. Eles pensam que serão ouvidos por força das muitas palavras» (Mt 6,7). Os versículos que a liturgia nos oferecem hoje são justo aqueles que são omitidos – quase colocados de lado, para poder dá-los mais adiante – na perícope que lemos na Quarta-feira de Cinzas. Podemos, deste modo, acolher este evangelho da oração, depois de ter meditado, no primeiro domingo da quaresma, o anti-evangelho das pretensões diabólicas que tendem a confundir, em nós, a imagem autêntica do Pai, de que Jesus se mostra filho através da escuta, e não por consequência de privilégio. Quando o Senhor nos diz para não desperdiçar palavras, não quer calar-nos, mesmo porque, imediatamente depois, doa-nos algumas palavras que «nós ousamos dizer» ao Pai, com toda a nossa confiança filial. Muito mais, o Senhor Jesus deseja que a nossa oração tenha, como origem e como meta, a consciência, que ela não força, mas muito mais, coloca-nos nas condições para que o Pai possa agir. De fato, «sabe do que precisais, muito antes que vós o peçais» (6,8). Ter consciência do fato de não poder contar nada a Deus que Ele já não saiba, já é um modo para ir contar-lhe tudo, pela alegria de sentí-lo pai e de sentir-nos filhos. Exatamente como faz uma criança que tem necessidade de contar as mesmas coisas e um pai que conta, cada noite, a mesma fábula, com uma recíproca cumplicidade, na qual se faz de conta que não se sabe como termina, só pelo desejo de prolongar o tempo que se passa junto. Neste sentido, então, a oração segue a mesma lei da palavra de Deus, assim como narra o profeta Isaías: «Como a chuva e a neve descem do céu e não retornam [...] sem efeito» (Is 55,10-11). Quando a oração nos coloca em relação a Deus, recordando-nos docemente quanto ele ame estar em relação conosco e com as nossas necessidades, então atingimos plenamente o seu efeito. Quando entramos neste dinamismo, então a oração se faz, não uma fuga da vida, mas uma escola de vida, porque nos permite curar nossas relações intra-humanas, com algo a mais de compreensão e de acolhimento. Também eu, muitas vezes, não conheço, até o fundo, a necessidade de meu irmão e, do mesmo modo, também ele pode cair na terrível culpa de não compreender as minhas verdadeiras necessidades: então abre-se o espaço do perdão recíproco como respiro inevitável da vida. Agostinho pergunta-se e pergunta-nos, justamente comentando a última petição da oração do Senhor, colocando na boca do Pai, a quem nos dirigimos este pedido: «Quais tuas ofensas? Todas ou somente algumas?» e acrescenta: «Tu responderás “Todas!”», e conclui: «Assim, pois, deverás perdoar todas ao que te ofendeu»[1].
MichelDavide Semeraro

Homem orante de Pedret, séc. IX, o homem que ora é circundado pela "energia divina" e é conduzido pelo Espírito.




[1] Agostinho, Sermões 83.

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