A participação ao corpo teândrico[1] de Cristo, à unidade existencial da comunhão dos santos, não é assegurada pelo mérito pessoal, pelas “virtudes” exteriormente reconhecidas do indivíduo, mas pela conversão, pela nova atitude de confiança em Deus, pelo entregar a vida inteira, aquela mesma vida pecadora e falida, a Cristo, na Igreja. A conversão não significa simplesmete o “melhoramento” ou ainda um “aperfeiçoamento” dos comportamentos individuais, dos sentimentos psicológicos individuais, um refortalecimento do querer individual. Todas estas coisas podem acontecer e mesmo assim o homem pode permanecer prisioneiro de sua individualidade autônoma, incapaz de amar e de participar da comunhão de amor que é a verdadeira vida. A conversão é uma mudança do modo de existência: o homem cessa de confiar em sua própria individualidade, porque compreende que existir como individualidade (até mesmo uma individualidade virtuosa) não o salva da corrupção e da morte, de sua atormentada sede existencial de vida. Por isso, ele se refugia na Igreja, onde existe como amante e como amado. Os santos o amam, dão-lhe um “nome” de alteridade pessoal e o acolhem na comunidade de seu amor, mesmo sendo pecador, e ele mesmo se esforça de amar os outros, mesmo sendo pecador, para viver livre das necessidades de sua natureza mortal. Luta para vencer suas resistências individuais, suas vontades individuais e seus impulsos autônomos, não para “melhorar-se” como indivíduo, mas para corresponder ao “amor louco” de Cristo e dos santos, aos pressupostos da vida pessoal e não da sobrevivência natural.
Assim o cristão não teme o pecado com aquele temor psicológico da culpa individual, com aquela aflição complexada pela transgressão individual que diminui o “valor moral” do seu ser individual. Ele sabe que Cristo, a Virgem Maria e os santos o amam ainda que pecador; sabe que Cristo o amou na sua condição de pecador “até a morte de cruz”. Sabe que dentro da Igreja o seu pecado se torna ponto de partida para viver o milagre da sua salvação da parte de Cristo; sabe que a condição humana ainda que nas suas fases mais “virtuosas” é toda pecado – insucesso e falência – “somente Cristo é sem pecado”. Teme o pecado somente como privação da possibilidade de corresponder ao amor de Cristo. Mas um semelhante “temor” já é um princípio de amor.
Ch. Yannaras, La libertà dell’ethos, 36-38.
[1] Teândrico: Theos= Deus; andros= homem; divinoumano, unidade das duas naturezas em Cristo.
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