tentação de Cristo, Arcabas, Igreja Saint Hughes de Chartreuse : |
Podemos dizer, também, que a alternativa entre auto-realização e amor corresponde à alternativa das tentações de Cristo: a alternativa entre o poder terreno e a cruz, entre uma redenção consistente no seu bem estar e uma redenção que se abre e se confia ao infinito amor divino. (...)
«Converte nos, Deus salutaris noster». A rejeição da auto-realização e o primado da graça, resumidos nesta oração, não pretendem um quietismo, mas muito mais, uma força nova e mais profunda da atividade humana. A auto-realização atropela a vida, interpretando-a como uma posse, e assim, coloca-se ao serviço da morte; a conversão é um ato da opção à reciprocidade do amor, a disponibilidade a deixar-se formar pela verdade, para tornar-se «cooperador da verdade», como diz S. João (III Jo 8). Consequentemente, a conversão é o verdadeiro realismo, que nos torna capazes para um trabalho realmente comum e humano. «Converter-se» quer dizer: não buscar o próprio sucesso, não buscar o próprio prestígio, a própria posição. «Converter-se» significa: cessar de construir a própria imagem, não trabalhar para construir um monumento a si mesmo, que termina, frequentemente, por tornar-se um falso deus. «Converter-se» quer dizer: aceitar os sofrimentos da verdade. A conversão exige que, não só geralmente, mas dia por dia, nas pequenas coisas, a verdade, a fé, o amor se tornem mais importantes que a nossa vida biológica, que o nosso bem estar, nosso sucesso, prestígio, nossa «vida tranquila». De fato, sucesso, pretígio, tranquilidade e comodidade são aqueles falsos deuses que, na maioria dos casos, impedem a verdade e o verdadeiro progresso na vida pessoal e na vida social. Aceitando esta prioridade da verdade, seguiremos o Senhor, tomaremos a nossa cruz e participaremos da cultura do amor, que é a cultura da cruz.
J. Ratzinger, Il cammino pasquale,
pp. 19-20.
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