sexta-feira, 28 de fevereiro de 2014

Jó e as leituras da 7 sexta feira do Tempo Comum

Marc Chagall
O apóstolo Tiago parece ter necessidade de alertar-nos contra uma visão da vida demasiadamente «rosada», na qual não exista espaço para o imprevisto da dor, do sofrimento, do difícil assumir as várias realidades do viver. Antes de mais nada, somos postos diante de uma exortação: «Não vos lamenteis, irmãos, uns dos outros» (Tg 5,9). Imediatamente depois de ter dito isto, o apóstolo Tiago parece sentir a urgência de esclarecer que o «não lamentar-se» é bem mais que um ato de virtude; é o sinal indicativo de uma atitude fundamental em relação ao mistério da vida. E com razão, acrescenta:«Tomai como modelo de paciência e constância os profetas que falaram em nome do Senhor» (5,10). E, entre os muitos exemplos possíveis, cita um que poderíamos definir como o mais dramático, ou pelo menos, o mais desestablizante de todos: «Haveis escutado falar da paciência de Jó, e conhecei a sua sorte final, que lhe foi reservada pelo Senhor, que é rico em misericórdia e de compaixão» (5,11).

Jó, oferecido como modelo de «paciência», torna-se o símbolo de como o homem possa assumir toda a realidade de suas própria vida, mesmo a mais dolorosa, sabendo dar-lhe um nome e carregá-la. Muito diferente é a solução para a qual pedem uma aprovação do Senhor Jesus, uma solução projetada pelos fariseus, em uma realidade que se torna o sinal simbólico de todas as dificuldades que podem surgir, inevitavelmente em uma vida de relações que sejam autênticas: «Perguntaram a Jesus se é lícito a um marido repudiar a própria esposa» (Mc 10,2).

A «sorte final» (Tg 5,11) é como o «início» (Mc 10,6) que o Senhor Jesus pede aos discípulos cheguem a atingir a sabedoria, para assumir os desafios da vida e enfrentar-lhes da melhor maneira. A fidelidade às promessas é possível somente se assumimos o gesto de Jó em relação ao mistério da vida, englobando também as possibilidades de dor e o drama da incompreensão. Os fariseus que perguntam ao Senhor Jesus são, de fato, do mesmo tipo dos amigos que atormentam Jó com as suas seguras teorias, meras constatações de uma dor que não experimentada na própria pele, mas somente lida nos livros. Jó é, ao contrário, uma palavra chave para quem deve aprender a levar com paciência o livre jugo do amor, mesmo quando este se torna muito pesado. O Senhor Jesus não minimiza as dificuldades, mas exclui as conclusões simplistas e cômodas. A aproximação litúrgica entre a exortação a ser pacientes como Jó e a estar atentos ao outro, sobretudo quando este é mais fraco, como o era a mulher na legislação daquele tempo, abre o espaço infinito das possibilidades e das escolhas que não podem ser nunca pré-fabricadas, nem absolutas. Jó é uma palavra contra quem se arrisca arrogantemente – como seus amigos – no seu direito de pontificar, sem conhecer e nem tocar com seu ser a realidade humana mais profunda. O Senhor Jesus, com sua resposta, não dá uma «receita», mas insiste em recomendar aos seus ouvintes, e a nós, a que tenhamos a coragem de recordar sempre o «início», para encontrar a valentia de chegar ao fim.
Senhor Jesus, a tua palavra é um juízo sobre toda forma de egoísmo e autoreferencialidade, não é uma espada suspenda sobre o coração de quem já sofreu tanto. Dá-nos a sabedoria e a honestidade de sempre começar, e de recomeçar à partir de nós mesmos, mais que ceder ao juízo dos outros ou à pretensão de que sejam os outros que devem que pagar pela inevitável fadiga de viver.