terça-feira, 16 de junho de 2009

O labirinto


O L A B I R I N T O

O desenho é reprodução de um Labirinto que está na base do campanário, na entrada da catedral de Lucca, Toscana, Itália, feito provavelmente antes do séc. XI.

Partimos do local em que ele costumava estar nas igrejas cristãs: a entrada. Junto com os monstros e animais guardiães, ele tinha a função de alertar sobre a sacralidade do lugar: é um símbolo abstrato da regeneração, do enfrentar a morte e receber de novo a vida, do vencer a força misteriosa que nos ultrapassa e amedronta (monstro) para conquistar um sagrado, de valor infinito. Ninguém entra em uma igreja para sair o mesmo!
Dois elementos fundamentais, cujas explicações não podemos fornecer aqui, mas que deixamos como pressuposto: o círculo representa Deus, a divindade, a perfeição, a realidade eterna, o Céu. O quadrado, seu oposto, representa o mundo, a realidade terrestre, o imperfeito, o limitado, o humano.

Ao lado do desenho original esculpido na pedra, está escrito que esse é o labirinto do rei Minos, da Ilha de Creta, onde entrou e venceu Teseu. Mas, qual seria a finalidade de um elemento pagão em uma igreja cristã? Os cristãos sabiam interpretar os símbolos profundos, vendo-os como figura do grande e único Mistério: a Encarnação Morte e Ressurreição de Jesus Cristo. Sabemos como era e é importante no cristianismo o elemento da peregrinação, o dirigir-se para o lugar sagrado, e entre tantos que haviam, um sempre foi insuperável: o Santo Sepulcro de Jerusalém. Mas nem todos podiam fazer essa viagem tão longa e perigosa, e foi por isso também que começaram a aparecer os labirintos nas entradas das igrejas, como uma miniatura da peregrinação a Jerusalém, naquilo que ela tinha de conteúdo mais essencial: o integrar todo o corpo num itinerário, na direção do Senhor e ao mesmo tempo em companhia dEle. Estamos, pois, diante do símbolo do itinerário espiritual, do caminho para Deus, e por isso mesmo, um caminho místico. Não é retilíneo, mas torto, e isso já nos dá grandíssima alegria, porque é como nós... Mas as curvas nada mais são que movimentos dentro do círculo, logo, divinos! O homem, nas suas muitas voltas, não faz outro que rodear o próprio Deus! Logo de entrada, depois de umas poucas voltas se encontra muito perto do centro, como é comum acontecer aos principiantes na vida espiritual, tendo muitas “consolações” e um sentimento da proximidade de Deus, mas ainda falta muito caminho. Neste labirinto, a proximidade física não corresponde àquela do processo. Ao final, quando falta pouco para chegar ao centro, o viajante dará as voltas mais distantes do centro, e não obstante, no processo estará mais perto. A riqueza do símbolo é justamente de unir longe e perto numa mesma experiência. O que importa mesmo é que se esteja dentro, fazendo as voltas, pois “é em Deus que nos movemos e somos”.

Neste caminho de vida o importante é não retroceder nem parar, já que ele vai como uma “pista única”, rumo ao centro. Cada pessoa o faz segundo sua velocidade, estilo e ritmo. Agora, não é simplesmente caminhar, já que tem reviravoltas bruscas, que revertem a direção mesma da rota. As pequenas e fortes curvas, que parecem nos mandar de volta, que nos dão a impressão de retroceder, formam uma cruz que abraça todo o labirinto, ainda que não a percebamos à primeira vista. Seria como uma grande cruz no centro do mundo e de Deus, unindo essas duas realidades, mostrando como Deus entra no mundo, e ao mesmo tempo, o caminho do homem, do mundo até Deus. Será sempre a cruz a mudar nossos rumos, mas de maneira transfigurante, já que faz parte da dinâmica divina (redondo). “Quanto a mim, Deus me livre de gloriar-me, a não ser na Cruz de Nosso Senhor Jesus Cristo , pela qual o mundo está crucificado para mim e eu para o mundo.”[1]

Enfim, muitas outras coisas podem ser descobertas dentro deste antigo e rico símbolo que se revela, pouco a pouco ao olhar atento. Olhá-lo com calma pode ser de ajuda para treinar o olhar interior na contemplação da natureza e sobretudo dos finos dedos da Mão de Deus na História. Um momento de parada na vida, uma celebração viva da liturgia pode ser este “ver o labirinto de cima”, intuir-lhe o sentido, alegrar-se com sua beleza, retomar as forças para continuar caminhando. “Não que eu já tenha alcançado o prêmio, ou que já seja perfeito, mas prossigo a minha carreira para ver se de algum modo o poderei alcançar, visto que fui apreendido por Jesus Cristo. Irmãos, não penso havê-lo já alcançado, mas uma coisa eu faço: esquecendo-me do que ficou para trás e avançando para o que está adiante, prossigo em direção do alvo para obter o prêmio da soberana vocação de Deus em Cristo Jesus.[2]


[1] “Gl 6, 14.

[2] Flp 3, 12-14.

Um comentário:

Marcelo Apontes disse...

Meu estimado irmão em Cristo, gratidão pela sua vida e suas expressões luminosas! Seja abençoado para sempre!