Como explica um texto admirável de Michel de
Certeau[1], tudo
isto acontecia «no mesmo dia» (Lc 24,1). Trata-se do primeiro dia da semana:
dia primeiro e último, dia no qual os discípulos parecem resignarem-se ao
«fato» da morte de seu Mestre e que, ao invés, é o dia de sua ressurreição,
capaz de recolocar em caminho a vida e a história desde um ponto completamente
novo e inesperado.
Tudo isto torna-se possível porque «Jesus, em pessoa,
aproximou-se deles, e caminhava com eles» (24,15), fingindo uma ignorância que provocaria, nos discípulos, a
possibilidade de um conhecimento total e completamente novo.
Gregório Magno,
enquanto comenta este texto, exprime-se assim: «A Verdade, que é simples, não
fez nada com duplicidade; ela simplesmente manifestou-se aos discípulos no seu
corpo assim como era no espírito deles. A Verdade caminhava com eles; não podiam,
pois, permanecer estranhos ao amor e, por isso, ofereceram-lhe a hospitalidade,
como se faz com um viajante»[2].
Às mulheres que vão ao sepulcro e lá encontram
o Mestre ressuscitado e desejoso de indicar-lhes caminhos novos de vida e de
alegria, sucedem, hoje – naquela que poderíamos definir como galeria das
testemunhas da Oitava de Páscoa – estes dois discípulos, que – um pouco como o
profeta Jonas – vão na direção oposta àquela da Cruz, quase para subtraírem-se,
em uma mistura de medo daquilo que lhes poderia acontecer e de uma nostalgia
sutil daquilo que poderia, ao contrário, ter sido: «Nós esperávamos que ele
fosse aquele que teria libertado Israel» (24,21). É tal a angústia que ferroa o
coração dos dois discípulos, que eles tem necessidade de falar com alguém
daquilo que lhe sufoca o coração: tomaram a decisão – estão indo longe de
Jerusalém – mas a palavra – tão evidentemente absurda – das «mulheres» (24,22)
deixou-os «desconcertados» e continua trabalhando-os interiormente, como um
cupim.
Se é típico das mulheres manifestar e afirmar
os próprios sentimentos mais profundos, é próprio dos homens exorcizá-los com
os raciocínios. O Senhor Jesus revela-se a partir do modo que cada um tem para
enfrentar as grandes passagens da vida, por isso faz-se encontro diante das
mulheres, em um face a face exaltante, e diante destes dois homens, caminhando
próximo com eles, e subtraindo-se à sua vista, quase para não humilhar as
conclusões a que chegaram, com seus raciocínios, repletos de evidências.
Não é
diferente a situação da qual nos fala hoje os Atos, e que acontece «junto à
porta do templo, chamada Bela» onde «com frequência» era colocado um
paralítico. Quem esperaria uma cura quando está acostumado receber «esmolas»
(At 3,2)? O mistério pascal de Cristo Senhor nos convida a tomar consciência da
nossa profunda ignorância sobre aquelas que são as possibilidades da vida,
dentro e ao nosso redor. Saberemos, como Pedro e João, ser dispensadores de
esperanças sempre maiores, que se exprimem em uma só palavra: «Caminha!»?
Fra MichelDavide Semeraro OSB, Messa quotidiana
– aprile, Bologna 2010, 145-147.
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