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São Marcos evangelista, mosaico do séc. XIII, Basílica de San Marco, Veneza, Itália. |
Na festa do evangelista Marcos, que acontece no coração do tempo pascal, nos é dado reler um texto que nos é muito querido para a evocação das aparições do Ressuscitado e que também, curiosamente, corresponde justamente àquela parte que os exegetas modernos pensam não ser do evangelista identificado com o discípulo de Pedro (cf. 1Pd 5,13), mas de uma outra mão. E mesmo assim, é justo aqui que podemos captar a mensagem que nos permite compreender, de um modo mais profundo, o mistério e o papel dos evangelista na vida da Igreja, como diz o trecho evangélico que lemos nesta festa: «Estes serão os sinais que acompanharão aqueles que creem...» (Mt 16,17). No texto, estão elencados alguns, mas talvez se poderia acrescentar, justamente entre estes, também os evangelhos de cujo gênero, Marcos é o «inventor». De fato, através da leitura amorosa do evangelho, nunca faltou, ao longo dos séculos, a possibilidade de entrar em contato com o mistério de Cristo. Não se trata, pois, de conhecer as circunstâncias, as palavras e os gestos realizados por Jesus durante a sua vida, mas de ter acesso a uma relação com Ele, capaz de animar a nossa existência, até o pondo de transformá-la. De resto, é assim que o texto se conclui: «O Senhor agia junto com eles e confirmava a Palavra com sinais que a acompanhavam» (16,20). Se existe um momento, no qual, seguramente, «O Senhor agia junto com eles», é aquele no qual os evangelista, em solidão ou in solido com outros discípulos, redigiram os evangelhos, de cuja fonte continuamos a beber a nossa fé que, ao longo dos séculos e ainda hoje, continua a dar tantos frutos de caridade e de beleza. Talvez um dos traços mais característicos dos evangelistas - e pois também de Marcos – é a capacidade de fazer-se mediador de uma Palavra que salva, que cura, que ilumina, que orienta, que consola.
Tudo isto é possível somente se alguém é altamente sensível à exortação do apóstolo Pedro: «Revesti-vos todos de humildade uns para com os outros, porque Deus resiste aos soberbos, mas dá a graça aos humildes» (1Pd 5,5). Se isto foi necessário para os evangelistas, o é ainda mais para nós que, do evangelho queremos viver. O tesouro do evangelho é confiado a corações frágeis e vacilantes, desde sempre. Como esquecer o versículo, precedente ao texto que lemos nesta festa, é uma reprovação feita aos apóstolos pela sua incredulidade... e isto não impede a Jesus de colocar-se em suas mãos, em seus corações, pensamentos, em seus gestos, para ser anunciado a todos... e hoje ainda está em nossas mãos, nos nossos corações, nos nossos pensamentos, nos nossos gestos. Não esqueçamos que anunciar o evangelho é um dom, antes e acima de tudo, para nós, e é na medida que ilumina e transforma a nossa vida é que pode ser dom para os outros, ao ponto de tornar-nos, também a nós, «sinais» para os outros: sinais capazes de designar, no sentido de referir-se a um Outro, para além de nós mesmos. Não se trata de fazer milagres, trata-se aceitar a ressurreição. O apóstolo Pedro, na primeira leitura desta festa, fala de «cura» (1Pd 5,7). O evangelho é a memória de como e de quanto Deus, no seu Filho Jesus, tenha tido tanto cuidado conosco, que nós, de agora em diante, podemos cuidar uns dos outros «com um beijo de amor fraterno» (5,14). O evangelho é a guia para aquele longo caminho que nos diz respeito, pessoalmente, um caminho através no qual nós aprendemos a deixar-nos guiar por Cristo Senhor, tornando-o presente na história e nos acontecimentos de nosso tempo.
Semeraro, M., Messa Quotidiana, Bologna, aprile 2013, 257-259.
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