quarta-feira, 18 de fevereiro de 2009

Por tentativas


Reflexão para a 6a Quarta-feira do Tempo Comum

Gn 8,6-13.20-22; Sl 115; Mc 8,22-26

Por tentativas

Na Palavra de hoje, é belo poder notar como não somos os únicos em proceder por tentativas no caminho da vida. Também Noé, de fato, depois de ter sido bem selado na sua arca, com todos os seus companheiros de aventura, «abriu a janela que tinha feito na arca» (Gn 8,6). Podemos imaginar a grande emoção contida neste gesto que, depois de «quarenta dias» de dilúvio, representa um grande sinal de coragem na direção da vida para além da morte: existiam muitos e bem fundados motivos para o medo. Esta janela representa a abertura renovada na direção da vida de um grupo de criaturas ameaçadas pela morte e que, para escapar dela, teve que fechar, atrás de si, as portas de uma vida falsa e defasada. O que permite a Noé salvar-se e de salvar, consiste no aceitar, confiando na Palavra que Deus lhe dirige, o «sepultar-se» com suas próprias mãos nesta arca, tão semelhante a um sarcófago, que é levada pelas mesmíssimas águas que submergem e fazem morrer todos aqueles que, e esta é a sua culpa, sentem-se demasiadamente em segurança. Noé aprendeu de Deus a proceder em tentativas, como o mesmo Jesus, quando «tomou o cego pela mão e o conduziu para fora do povoado» (Mc 8,23). Ele terá que impor «de novo as mãos sobre os olhos» para que ele veja claramente, ou seja, possa ver «cada coisa com a distância justa» (8,25). Parece que este cego tenha dificuldade de tomar a justa «distância» para poder ver sem ser sufocado pelos outros, como em uma floresta ameaçadora de «árvores que caminham» (8,24). O Senhor, depois da segunda tentativa, «mandou-o para casa dizendo: “Não entres no povoado!”» (8,26). Quanta delicadeza nestes gestos, através dos quais, o Senhor busca curar, e sobretudo busca compreender e orientar na direção de uma vida com horizontes mais amplos, que exige uma certa distância. Mas, para que uma cura aconteça, é necessário o tempo, e ela nem sempre acontece em um só golpe. Para que a salvação aconteça, é necessário o tempo e uma delicadeza extrema no perceber os sinais, sem forçá-los: «Noé, depois, soltou uma pomba [...] mas ela, não encontrando onde pousar seus pés, voltou à arca» - e eis o toque mágico do hagiógrafo – e será necessário mais tempo para que as águas se retirem – não resta senão esperar ainda, esperar juntos. Do lado de Noé, nenhuma atitude forçada, mas a vontade paterna de um mandato para uma missão, não separado de um toque materno de acolher de novo no seio seguro da arca: «Esperou outros sete dias [...] e ela voltou para ele no fim da tarde; e eis que trazia, no bico, um ramo de oliveira» (8,10-11). Mas não era tudo ainda: «Esperou outros sete dias, depois soltou a pomba; ela não retornou a ele» (8,12). Noé parece mesmo contente com esta partida e este desapegar-se; a vida da humanidade – começada no sexto dia da criação – recomeça exatamente «no ano seiscentos e um da vida de Noé, no primeiro dia do primeiro mês [...] Noé tirou a cobertura da arca» (8,13). Quantas tentativas para compreender a direção do vento da vida e para cumprir a promessa de manter a vida dos próprios semelhantes, até levá-los à alegria de estarem vivos!

Fra Michel Davide OSB

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