terça-feira, 14 de maio de 2013

TP 07 3 A verdade toda inteira

Holy Spirit Coming, by He Qi.
Se Jesus disse aos discípulos: «muitas coisas tenho ainda a dizer-vos, mas no momento não sois capazes de compreende-las» (Jo 16, 12), não significa que a sua instrução terrena deva permanecer incompleta por motivos exteriores – a fraqueza dos discípulos na escuta – e, conseqüentemente, deva ser completada. Isto vem contestado já pelo fato de que o intérprete, o Espírito, realize essencialmente essa instrução «recordando-vos tudo o que vos disse» (Jo 14, 26) E se, do intérprete mesmo se prediz que «dirá tudo o que terá ouvido e vos anunciará as coisas futuras» (16, 23), não parece descabido pensar que «coisas futuras» como referidas, antes de tudo, à sorte que esperava Jesus, à sua glorificação através da Cruz e da Ressurreição, única referência à qual a interpretação da Palavra pode ser feita na totalidade. «As coisas futuras» não indicam, em todo caso, uma revelação profética ligada ao tempo, mas muito mais (como em Is 41,23;42,23;44,7) a abertura da dimensão escatológica, isto é, que, no evangelho, vem chamado de saber ler os sinais dos tempos, saber reconhecer o aproximar-se do fim (Mt 24,32).

«A verdade toda inteira» não significa, então, a síntese de um certo número de verdades isoladas, mas sim, da única verdade da interpretação de Deus, através do Filho, na inexaurível plenitude da sua concreta universalidade. Ela já está presente no momento no qual o Filho, com toda sua existência incarnada, interpreta a verdade do divino amor: tal interpretação é «a glória da plenitude da graça e verdade» (Jo 1,14.17), e é, mesmo, o «verdadeiro testemunho» (Jo 5,31; 8,14). Em um sentido análogo, também o Espírito não comunicará, ulteriormente, somente elementos desta interpretação, mas dará dela o «testemunho» (J0 15,26), ou seja, a sustentará com todo seu ser. Compreendida no seu sentido teológico, tal testemunho é dado não somente diante de alguém, e nem menos, somente para alguém, mas muito mais, como doação, reveladora do que é próprio, a favor de alguém, e até mesmo, no caso de que seja aceita, dentro de alguém. Em João 1,14, a «verdade» é, ao mesmo tempo, «graça». A abertura do espaço do amor entre o Pai e o Filho acontece, no Filho, com sua doação ao mundo; e conseqüentemente, a introdução do Espírito, neste espaço aberto do amor, que é a verdade, é, ao mesmo tempo, a doação do Espírito dentro daqueles que acolhem o seu testemunho. Aqui é necessário recordar sempre que o Espírito é, contemporaneamente, a atestação (objetiva) do amor intercorrente entre o Pai e o Filho (expresso dogmaticamente como «terceira Pessoa») e o fruto interior deste amor recíproco (subjetivo), de modo que se possa chamar Espírito de Amor do Pai e, ao mesmo tempo, Espírito de Amor do Filho (cf. Rm 8,9). A sua obra de introdução na «verdade toda inteira» é então, antes de tudo, algo muito diferente de uma instrução objetiva, já que, muito mais, uma condução a uma participação íntima, a partir de uma participação íntima. Ele tem a força de realizá-lo, como está a demonstrá-lo o termo dynamis, que em Paulo, aparece freqüentemente junto com a pneuma, a ponto de amos os termos sejam intercambiáveis. Graças a Ele, «que escruta as profundidades de Deus» e nos vem comunicado como tal (I Cor 2,10.12), nós aprendemos a conhecer quem seja este Deus-Pai, que «tanto amou o mundo, a ponto de dar seu Filho unigênito» (Jo 3,16), e junto, quem seja o Filho, que se encarrega de revelar tal amor do Pai, até a glorificação sobre a Cruz e o coração transpassado. Com isso, nós somos introduzidos não somente em uma Trindade econômica voltada para fora de si, mas, até mesmo, em sua verdade imanente, pois ao contrário, a introdução realizada pelo Espírito não alcançaria, de fato, «a verdade toda inteira», e restaria, no fundo, ainda, alguma coisa de não comunicado do mistério de Deus. Nós somos introduzidos não somente nas «energias» de Deus, mas também, nos abismos imperscrutáveis da sua essência, que em sua mesma revelação e comunicação, permanecem incompreensíveis.

H. U. Von Balthasar, Nella pienezza della fede, 220-221.

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