segunda-feira, 4 de março de 2013

20 Predispor o coração para a caridade

Comida na casa de Simão, e a pecadora que muito amou. Sant'Angelo in Formis, séc. XIII.
Para que o jejum e a ascese possam realizar eficazmente a sua função, é necessário que sejam praticados com consciência de causa. Não se trata, simplesmente, de sobrepor a alguns de nossos atos um significado intelectual, e muito menos de cumprir algumas práticas por pura obrigação. É necessário, muito mais, que o movimento interior, suscitado pela graça, envolva também o nosso corpo.

Neste mesmo movimento, é necessário que a medida da ascese seja proporcionada às possibilidades reais do sujeito. Eis porque os Padres do deserto insistiam tanto sobre a discrição: ela tem a missão de assegurar este equilíbrio. A sua função não é aquela de fixar regras, mas de proporcionar, concretamente, as exigências externas às forças do sujeito e às monções interiores do Espírito, com o fim de tornar sempre possível um verdadeiro propósito pessoal. Se é o Espírito que convida e que dá a força, também certos “excessos”, ao invés de atentar contra a integridade física e espiritual, vão favorecê-la. Temos inumeráveis testemunhos nas vidas dos santos. O que os Padres do deserto pediam, ao contrário, a um fraco, a um pecador que buscava retomar o caminho, era de uma surpreendente condescendência. Os critérios que permitem, nestes casos, uma decisão, são os sinais clássicos do discernimento dos espíritos: qual é o meio que favorecerá, primeiramente, a paz da alma, a mansidão, a ausência de ansiedades, de durezas e de asperezas? Aqui se mostra indispensável o conselho de um pai espiritual.

O jejum é inseparável das outras práticas tradicionais da ascese cristã e do exercício concreto da caridade. Justamente em virtude de seu caráter essencialmente simbólico, os exercícios da ascese, corporal não podem ser trocados um pelo outro. Cada um deles «simboliza» um aspecto diverso do esforço ascético, e juntos, constituem um organismo no qual, cada elemento tem sua função própria. Seria absolutamente prejudicial à vida espiritual, por exemplo, se reduzíssemos toda a ascese para cumprir bem o próprio trabalho e sustentar as dificuldades cotidianas da vida. Tudo isto é necessário, sem dúvida, mas não é o símbolo eficaz daquela atitude de pobreza espiritual, de negar-se a confiar somente nas forças da carne, de humilhação diante de Deus, que o jejum deseja expressar...

Sobretudo, e o proclamam com força os profetas de Israel, deve-se unir ao jejum, o exercício concreto da caridade para com o próximo. Os Padres recordam, constantemente, que o jejum deve permitir ao cristão satisfazer ao dever da esmola e que ele, sozinho, não tem nenhum sentido se não predispõe o coração à caridade.

PIacide Deseille, Humilier son âme..., 14-17.

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