sexta-feira, 22 de março de 2013

37 A oração, fruto do arrependimento

S. Pedro arrependido, Frei Agostinho da Piedade OSB, 1636, Mosteiro de S. Bento, Salvador BA.
A verdadeira oração, aquela que nós somos, a nível de nossa existência profunda, não pode existir senão como fruto da conversão. É ali que desemboca o caminho de conversão. Antes deste momento da conversão, a oração poderia ser nada mais que uma empresa do homem em busca de Deus. O fiel, então, se empenharia, com todas as suas energias, na tentativa de orientar cada uma das suas faculdades na direção de um Senhor que se esconde. Um esforço digno de mérito, certamente. Ele buscaria fazer de Deus, o objeto de sua inteligência, poderia ainda, por assim dizer, esforçar-se por produzir algum sentimento, mas o resultado de uma tal ascese seria sempre passageiro e superficial. Se, antes, o coração não se purificou, e não se inflamou, por si mesmo, na oração, todo esforço pela oração permanece estéril.

A oração deve nascer da conversão. Eis que, de improviso, ela brota e se torna logo um rio, que nada poderá barrar. É o fruto imediato da compulsão de coração. Katanyssein e compungere, de fato, significam, literalmente, perfurar, transpassar. O olhar misericordioso de Deus perfura e transpassa o coração. O corpo, então, efunde-se em lágrimas, e o coração em oração. «Quando choras», anota Isaac o Sírio, «os teus pensamentos dão o primeiro passo no caminho da vida eterna» (Discorso, 15). O novo nascimento está próximo.

Primeiramente, esta oração brota do profondo da angústia, desafoga a própria miséria. É um grito de ajuda, um implorar pelo perdão. Mas, na medida que vai inundando o coração com o seu fluir incessante, mais se pacifica e se reconcilia, por assim dizer, com o pecado. Mais que isso, ela termina por desviar o olhar da própria fraqueza, para fixá-lo unicamente no rosto de misericórdia.

O arrependimento se transmuta, então, pouco a pouco, em uma alegria humilde e discreta, um temor amoroso, e enfim, em ação de graças. A culpa não é negada, nem dissimulada, mas se converte em perdão.

Lá, onde abundava o pecado, a graça não cessa de superabundar (Cf. Rm 5, 20). Tudo o que o pecado havia destruído, a graça restitui a um incomparável esplendor. Se a oração leva, ainda. Sinais da culpa e da miséria, trata-se, definitivamente, de uma felix culpa, de uma culpa assumida e envolvida pelo amor. A oração, então, está próxima de tornar-se uma incessante eucaristia.

A. Louf, Repentir et expérience de Dieu, 41-42.

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