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Mosaico de Monreale, Sicilia, Itália, séc. XIII. |
Máximo de Turim instaura um paralelo entre Ulisses,
fustigado na sua barca, em meio ao mar, e obrigado a tapar os ouvidos, para não
ser encantado e vencido pelo dulcíssimo e inexorável canto das sereias, e o
Cristo Senhor: «Se a lenda conta que Ulisses fez-se amarrar ao mastro para
fugir do perigo, hoje, através do lenho da cruz, a humanidade inteira escapou
da morte» e acrescenta: «Desde que Cristo foi pregado na cruz, nós atravessamos
as provas e as tentações do caminho deste mundo, como se nossos ouvidos
estivessem tapados, para não nos deixar mais enganar pelas seduções do mundo»[1].
Talvez possamos forçar, ulteriormente, a imagem e a aproximação do bispo
Máximo, dizendo que não basta fugir da atracão ilusória das sereias, resistindo
ao seu chamado, mas como Simão Pedro, é necessário – uma vez que se reconhece a
presença do Cristo que nos espera na margem – saber atirar-se no mar, para
fazer com que, o que nos separa dele, a Ele nos leve. Estranhamente encontramos
somente sete dos doze apóstolos a que estamos acostumados, e dois não tem um
nome preciso... talvez o evangelista tenha criado um espaço vazio, no qual
inserir serenamente o nosso próprio nome e aquele de tantos que levamos no
coração? Porque não?
Enquanto levamos a termo os dias da Oitava da Páscoa,
queremos fazer nosso o gesto quase instintivo de Simão Pedro, o qual, «apenas
ouviu que era o Senhor, cingiu-se a veste, porque estava nu, e se jogou no mar»
(Jo 21,7). Talvez também nós não tenhamos, como Simão Pedro, aquele dom de
intuição e de revelação, próprios do discípulos amado, o que não nos tira que,
não apenas tenhamos nos dado conta da presença do Senhor na margem do mar de
nossa existência, possamos atirar ao mar todas as coisas, incluindo nós mesmos,
para poder chegar até Ele e receber de suas mãos maternas o pão e o peixe, que
nos nutrem e nos dão forças para retomar continuamente o caminho... para tentar
outra vez a pesca, mesmo quando o mar da existência parece tão terrivelmente
esvaziado de esperança. Podemos fazer mais que nossas as palavras do salmo:
«Nós te pedimos, Senhor: Dai-nos a salvação! Te pedimos, Senhor: dai-nos a
vitória!» (Sl 118,25).
Depois de ter rezado assim, depois de ter imitado o
gesto de Pedro, que corresponde à intuição do coração amante de João, não
podemos senão fazer nossa a mesma profissão de fé, sem temor e com exaltação
alegre: «Este Jesus é a pedra, que foi rejeitada por vós, construtores, e que
se tornou a pedra angular. Em nenhum outro se encontra a salvação; não existe,
de fato, sob o céu, outro nome dado aos homens, pelo qual possamos ser salvos»
(At 4,11-12). Parece quase paradoxal, mas a nossa salvação está ligada à nossa
capacidade de arriscar a vida, atirando-nos no mar. Não será, talvez, esta a
lógica do batismo que um dia recebemos e que cada dia somos chamados a viver no
mar da vida, bem mais perigoso do que pode ser uma fonte batismal? Mesmo assim,
se nos sentimos esperados do outro lado, nenhum medo poderá bloquear-nos, para
escutar, com o ouvido do coração, o chamado muito mais doce do que aquele das
inumeráveis sereias que buscam seduzir-nos: «Filhinhos, tende alguma coisa para
comer?» (Jo 21,5). A nossa resposta é: «Não!» e a resposta do Senhor é o «pão» e o «peixe» (21,13)... Ele mesmo, «é o Senhor» (21,7)... é «este
Jesus» (At 4,11) , o qual sempre esteve lá enquanto nós nos fadigávamos em vão!
Fra
MichelDavide Semeraro OSB, Messa quotidiana – aprile, Bologna 2010, 163-165.
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