domingo, 7 de abril de 2013

TP 02 1 A fé de Tomé

Desenho preparatório para a pintura da Igreja do Ressuscitado, Umbertide, Úmbria, Itália 2000.
A atitude de Tomé mostra, antes de tudo, que se de um lado a fé é recebida através da comunidade, todavia ela é um ato pessoal, crítico. Tomé é recordado como “um dos doze” e estes são mencionados em dois agrupamentos (Jo 20, 24-25). Esta expressão, que é rara em João, nos convida a reconhecer toda a importância do colégio dos apóstolos no despertar da fé. É por causa de seu testemunho que Tomé começou a perguntar-se e se colocou sobre o caminho do reconhecimento de Jesus.

Os Doze, além de tudo, se reúnem oito dias mais tarde. Esta indicação, que segue aquela do primeiro dia da semana ou dia de Páscoa, é certamente indicativa do quadro litúrgico da comunidade nascente durante a qual tomou forma a catequese sobre a aparição a Tomé. Ela é reforçada por um outro traço fornecido pela saudação: “A Paz esteja convosco!” em uso ainda hoje nas celebrações eucarísticas. Tudo isto mostra a importância da assembléia e da celebração litúrgica, acentuando o papel daqueles que dela participam, no direcionamento de alguém ao Mistério de Cristo Ressuscitado.

Para compreender o caminho de Tomé e o termo aonde ele chegará: crer sem ver, é preciso observar de onde parte. Uma outra passagem pode iluminar este ponto: aquele do encontro de Jesus com os discípulos antes da sua partida (cf. Jo 14, 1s). Tomé mostra muita dificuldade em compreender o duplo sentido que Jesus dá a algumas de suas palavras. Diz: “Aonde irei, vós o sabeis e conheceis o caminho”, e Tomé rebate: “Senhor, não sabemos aonde vais, como podemos conhecer o caminho?” Mas Jesus falava do caminho que é Ele mesmo. Essa dificuldade de compreender de Tomé encontra-se também na sua reação a não pensar senão na morte, quando Jesus evoca a própria Glória (Jo 11, 15-16). Será Filipe a colocar a questão que obterá a resposta: “Filipe, quem me vê, vê o Pai. Como podes dizer-me: ‘Mostra-nos o Pai’? Não tendes fé?” (Jo 14, 9-10).

Assim, ver Jesus é vê-lO humanamente, em carne e osso, mas, sobretudo, para além do que é visível aos olhos, atingir a sua pessoa e conhecê-la crendo nEle. Este conhecimento é, pois, ao mesmo tempo, “um reconhecimento”. Pode acontecer de permanecermos perto de alguém sem jamais chegarmos a conhecê-lo. João associa constantemente os dois termos Ver-Crer para fazer ressaltar este aspecto particular da fé que é um ver através dos fatos concretos, ou através da pessoa mesma de Jesus. Não se trata aqui nem de uma gnose, nem de uma ideologia, mas da fé no Deus feito homem. É este sentido particular que ele dá ao termo ‘testemunho’, tão freqüente no seu evangelho.

O que torna os discípulos testemunhas não é somente o fato de que tenham visto o Cristo em carne e osso: isto aconteceu também com outros, que passaram ao seu lado e não o reconheceram. Aquilo de que são testemunhas provem de sua atitude de acolhimento que, através dos sinais feitos por Jesus, fez-lhes perceber um apelo a crer nEle. Aqui a fé de Tomé é resumida em uma palavra, que engloba a totalidade da sua experiência: viu, no sentido de “reconhecer na fé” depois da ressurreição. A fé é entrar em contacto com Jesus, um Jesus que é Senhor-Deus, através o acolhimento de sua Palavra. O texto não diz que Tomé tenha acreditado fazendo o gesto que lhe foi pedido.

Interpretar a aparição a Tomé com tal chave de leitura significaria seguir a linha de Lucas, mas seria uma infidelidade a João, para o qual Jesus, depois da ressurreição, é aquele que não pode mais ser tocado, como mostrou o relato precedente, consagrado a Maria Madalena. Com as palavras: “Coloca o teu dedo...” Jesus atinge a preocupação de Tomé, e o fato de descobrir-se visto pelo Senhor provoca uma reviravolta no apóstolo. Acontece como com Natanael (Jo 1, 48) e de outra maneira com Maria Madalena. (Jo 20, 16). É sobre essa palavra de Jesus que ele imediatamente grita sua confissão de fé: “Meu Senhor e meu Deus”.

G. Becquet, Lecture d’evangiles..., pg. 382-384

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