domingo, 28 de abril de 2013

TP 05 1 Às Quartas feiras, milagre

Cirineu ajuda Jesus, Mural "Criação e Via Crucis" Cripta da Catedral de Ponta Grossa, PR. 1994
Aquela tarde perguntou a Gabriela – um dos pequenos personagens de um romance de Gerard Bessiere – seu amigo Jacinto:

– Que fez hoje na escola?

– Fiz um milagre – respondeu a menina.

– Um milagre? Como?

– Foi no catecismo.

– E, como foi que fez o milagre?

– Temos como professora a uma senhorita que está muito doente. Não pode fazer nada sozinha, somente falar e sorrir.

– E o quê aconteceu?

– A senhorita falava dos milagres de Jesus. E as crianças disseram: ‘Não é verdade que existam milagres. Porque se existissem, Deus já teria te curado’.

– E ela, quê disse?

– Disse: ‘Sim, Deus faz também milagres para mim’. E as crianças perguntaram: ‘Quê milagre Ele fez?’

– E então?

– Então ela disse: ‘Meu milagre são vocês!’ ‘Porque?’, lhe perguntamos. E ela disse: ‘Porque vocês me levam a passear, nas quartas-feiras, empurrando minha cadeira de rodas’. Compreendeu? Fazemos milagres todas as quartas à tarde. A senhorita disse também que haveriam muito mais milagres se a gente quisesse fazê-los.

– E você, gosta de fazer milagres?

– Gosto. Tenho vontade de fazer um montão deles. Primeiro pequenos. Quando eu crescer farei maiores.

– Todas as quartas?

– Quero fazê-los todos os dias, toda a vida.

– Não parece que a vida é também um milagre?

– Não. – disse Gabriela – A vida é para fazer milagres!

Gabriela tem razão, a vida é para fazer milagre, às quartas, às quintas e aos domingos. A vida não é para sentar-se esperando que Deus faça milagres espetaculares, não é para limitar-se a confiar que Ele resolva nossos problemas, mas para começar a fazer este milagre pequenino que Ele colocou já em nossas mãos, o milagre de amar-nos e ajudar-nos. Quê é mais milagroso, devolver a vista a um cego ou a felicidade a um amargurado? Será mais prodigioso multiplicar os pães do que saber reparti-los bem? Mais espetacular mudar a água em vinho do que o egoísmo em fraternidade? Se os homens dedicássemo-nos a construir milagres pequeninos na metade do tempo que gastamos em sonhá-los espetacularmente, seguramente o mundo já estaria caminhando muito melhor.

E o milagre de amar podem fazê-lo todos, crianças e grandes, pobres e ricos, sãos e enfermos. Prestem bem atenção, a um homem podem privá-lo de tudo, menos de uma coisa: de sua capacidade de amar. Um homem pode sofrer um acidente e não poder nunca mais andar, Porém não existem acidentes que nos impeçam de amar. Um enfermo mantém integral sua capacidade de amar: pode amar o paralítico, o moribundo, o condenado à morte. Amar é uma capacidade inseparável da alma humana, algo que conservará sempre, inclusive o mais miserável dos homens.

Somente no inferno não se poderá amar. Porque o inferno é literalmente isso: não amar, não ter nada para compartilhar, não ter a possibilidade de sentar-se junto a alguém e dizer-lhe: “ânimo!”.

Porém, enquanto vivemos não existem correntes que aprisionem o coração, a não ser as do próprio egoísmo, que é como uma antecipação do inferno. “Os verdadeiros criminosos – dizia Follereau – são os que passam a vida dizendo «eu» e sempre «eu»”.

E ao contrário, ali onde se ama, começou-se a construir alguma coisa do céu, com golpes de milagres. Definitivamente, os milagres, para Jesus, eram antes de tudo “os sinais do Reino”, e qual é o melhor sinal de um Reino de Amor total do que começar amando, com amores pequeninos como os de Gabriela e de suas companheiras de escola?

José Luiz Martin Descalzo, Razones para el Amor.

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